“E chegaram a Cafarnaum. Quando ele estava em casa, perguntou-lhes: "O que vocês estavam discutindo no caminho?" Mas eles [os discípulos] guardaram silêncio, porque no caminho haviam discutido sobre quem era o maior. Assentando-se, Jesus chamou os Doze e disse: "Se alguém quiser ser o primeiro, será o último, e servo de todos". (Marcos 9:33-35 – Nova Versão Internacional).
A afirmação de Jesus veio na contra-mão das expectativas de seu tempo, e também do nosso tempo. Que contradição: o maior deve ser o menor! o primeiro deve ser o último! Uma nova maneira de conceituar o poder: o poder é dado para que se possa servir! Autoridade como serviço, e portanto, subalterna ao bem comum!
Talvez seja por isso que a Igreja Cristã, a partir de determinado momento, organiza seu clero em três Ordens: diaconato, presbiterado e episcopado, uma ordem dada sobre a outra, sendo o diaconato a primeira a ser dada. Nós, episcopais anglicanos mantemos essa tradição, o que significa que todo nosso clero é formado por diáconos (servos), onde alguns diáconos são também presbíteros e outros diáconos são, além de presbíteros, bispos. Outras identidades eclesiais separam o diaconato do presbiterado, mas nós seguimos a Tradição que vem dos primeiros séculos da Igreja.
Entretanto, a afirmação de Jesus vai além da Igreja, é um alerta ao mundo. Somos (mal) educados, como cidadãos, a entender que a Autoridade é soberana (e o é), mas de forma absoluta. Confundimos, por exemplo, Governo (quem exerce a autoridade) com Estado (a organização social onde exercício da autoridade é delegado às pessoas que compõem o Governo); e assim nos acostumamos com a corrupção e com as trocas de favores: “vou votar em fulano de tal porque se eleito vai me dar um emprego!”; “não vou votar no sicrano porque quando foi prefeito não dava passagem de ônibus de graça para eu ir à cidade vizinha!” como se o prefeito ou qualquer autoridade pudesse dar aquilo que não lhe pertence (é do Estado), mas está sob seu cuidado (administração, isto é, governo).
Assim, entendemos a autoridade como sendo o maior e mais importante, e lhe atribuímos, por ignorância devida à nossa má educação, o poder absoluto de fazer o que quiser com o bem comum; então surgem as badalações, as trocas de favores, a corrupção. Achamos tudo isso normal, como se fosse natural que o mundo seja assim: alguns tomam o poder e favorecem os seus amigos e aliados e desprezam todo o resto da população. Até mesmo para fazer uma obra em benefício da população, favorecem seus comparsas através da burla em licitações, permissão de superfaturamento, vista grossa quando a lei é ferida, etc. Vemos isso todos os dias denunciado pela imprensa e achamos tudo muito natural.
A Palavra de Jesus é muito clara e objetiva: a autoridade é para o serviço! Não é algo dado a uma pessoa para ela mesma, mas para capacitá-la ao serviço em benefício de todas as demais pessoas sob sua autoridade, em benefício do bem estar de todos!
Os cristãos, realmente comprometidos com a Palavra de Deus, têm o dever de exercer sua cidadania em plenitude e não se conformarem com o senso comum (o mundo). É dever ético cristão, implícito nas palavras de Jesus que a comunidade de fé anuncie essa visão de poder, denuncie os que abusam do poder e testemunhe, através de sua atitude cidadã, a Palavra de Deus.
Isso começa no nosso universo pessoal: como exerço a autoridade em minha casa, na qualidade de pai ou de mãe? como exerço minha autoridade sobre aqueles que são meus empregados, ou subordinados no trabalho? Se me foi delegado um cargo de autoridade, por exemplo, síndico do prédio, diretor da associação do bairro, professor, diretor de escola, etc., como eu a compreendo? como eu exerço esse poder que me foi delegado?
Assim, começando em nossas relações familiares, passando pelas relações profissionais, vamos exercendo a cidadania não só neste mundo, mas sinalizando sermos cidadãos de um outro Reino, o Reino de Deus, o Reino daquele “… que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até à morte, e morte de cruz!” (Filipenses 2:6-8 – Nova Versão internacional).
Rev. Luiz Caetano, ost+
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Um comentário:
Se os ensinamentos de Jesus não só fossem lidos, mas praticados, haveria menos corruptos na política e na igreja.
Jesus foi o maior Professor de Ética de toda a história, porque não seguir os seus passos?
Parabéns pelo texto, Rev. Luiz Caetano.
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