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30 junho 2011

Trindade, Deus Comunidade.

No Domingo de Pentecostes a Igreja celebra com alegria sua própria fundação, quando o Espírito Santo veio sobre o grupo apostólico e o tornou capaz de anunciar o Evangelho.
O domingo seguinte é chamado, pelo Calendário Litúrgico, Domingo da Santíssima Trindade. E após o Domingo da Trindade, o lecionário da Igreja nos propõe leituras bíblicas que pretendem iluminar a vocação missionária da Igreja. Assim, desde a Festa da Trindade, até o Domingo do Advento, a Igreja reflete dominicalmente, sobre sua missão no mundo, sobre seu testemunho e sobre sua vida em comunhão.
Por que um domingo dedicado à SS. Trindade? o que de fato se celebra nele? Geralmente as festas litúrgicas celebram fatos e memórias da fé cristã: assim, celebramos os eventos da vida de Jesus (Natal, Apresentação de Jesus no Templo, Epifania, Transfiguração, Paixão, Ressurreição, Ascenção); também celebramos a memória dos heróis e heroínas da Igreja (os santos e santas de Deus: Apóstolos, Mártires, Mestres, Testemunhas, a Mãe do Senhor) que inspiração e servem como modelo para o povo cristão; também celebramos a memória dos pioneiros da Igreja no Brasil. Entretanto a Festa da SS. Trindade é dedicada a uma afirmação de fé, a um fundamento básico da Fé Cristã.
Desde a Igreja Antiga essa doutrina é fixada no calendário litúrgico, isso porque trata-se do nosso fundamento de fé: sem a confissão da Trindade, o cristianismo poderia ser confundido com um politeísmo (três deuses). Na verdade, a doutrina sobre a Santíssima Trindade é o ponto de partida da Identidade Cristã, e é entendida  não como uma explicação racional sobre Deus, mas como contemplação de um Mistério!
Não cabe aqui uma discussão teológica  sobre a Santíssima Trindade. Mas cabe apresentar uma visão simples que nos ajude a contemplar esse Mistério. A doutrina da Trindade apresenta Deus como uma Família, uma comunidade; não um deus isolado, distante e solitário, mas um Deus amoroso, que se revela como Comunhão Amorosa, Solidário, e Relacional.
A Igreja Antiga entendeu que esse Deus. o qual se revela  amoroso e solidário em Jesus Cristo, pode ser percebido em três dimensões distintas mas essencialmente una. Na língua grega, usada pela Igreja Antiga, a Terceira Pessoa (Espírito Santo), é referida com uma palavra feminina: Haggion Pneuma, equivalendo ao hebraico também feminino Ruhar (Espírito de Deus, Sopro de Deus).
A língua latina, que acabou sendo adotada pela Igreja do Ocidente, tem a palavra Spiritus como masculino, e por isso nas línguas derivadas do Latim apresentam três seres masculinos como parte da Trindade… ( o ) Pai, ( o ) Filho e ( o ) Espírito Santo. Isso que pode nos fazer imaginar que o Deus Cristão é mais parecido com uma antiga barbearia – algo completamente masculino – que uma comunidade de amor partilhado.
Prefiro pensar a Santíssima Trindade como Deus Criador, Deus Palavra e Deus Cuidador: Deus o Pai, Deus o Filho, Deus a Mãe (Espírito Santo). O Deus que quer a Criação, a Palavra que faz a Criação e a Mãe que dela cuida.
Em Jesus, o Cristo, a Palavra se manifesta como parte da história humana, assumindo totalmente a nossa humanidade. Esse Deus amoroso permanece conosco na comunidade gerada pela Mãe (Espírito Santo), que no seu ímpeto feminino serve como Sopro Divinal, Real Consoladora, Divina  Instruidora (cf. Hino 98 , H.E.) soprando onde quer (Intuição), cumprindo a Obra de Salvação apresentada em Jesus o Cristo.
Por isso, a Trindade é celebrada não só como complexa doutrina teológica, mas principalmente como modelo básico do amor humano, o amor em comunhão: a masculinidade, a feminilidade e tudo aquilo que tal comunhão amorosa gera, e cuida (cf. Gênesis 1.26-27: “Façamos o Humano à nossa imagem, conforme a nossa semelhança […] homem e mulher os criou”). Note bem, não me refiro ao sexo masculino ou feminino, mas  identidade masculina e identidade feminina!
O Deus Tri-Uno é, portanto, o paradigma da comunhão que deve existir entre os cristãos. A Festa da Santíssima Trindade, assim como todo o tempo após o Pentecostes, nos convida para vivermos em comunhão – paz, solidariedade, compreensão, misericórdia – e atuarmos no mundo como missionários desse Deus Amoroso, Solidário, Deus-Comunhão!
Luiz Caetano, ost+
(inspirado em uma reflexão do Rev. Daniel Cabral)
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02 junho 2011

Jesus foi para ficar conosco!

jesasce10Celebramos a Ascensão do Senhor na quinta-feira anterior ao sétimo domingo da Páscoa. Dez dias após, é a Festa do Pentecostes, sobre a qual comentamos em nossa postagem anterior (“A Resposta vem chegando com o Vento”).
Costumamos imaginar a cena da Ascensão como Jesus subindo ao céu, decolando lentamente dum montículo de pedra… é uma imagem que nos foi legada pelos antigos, e na concepção deles, isso tem muito mais a ver com um símbolo – o Cristo ascende ao Céu e reassume o poder divino, que propriamente a um fato. Se pensarmos como fato, e de acordo com as leis que o Criador deu à natureza, se Jesus “subisse” na velocidade da Luz, estaria a uma distância de quase 2 mil anos-luz da Terra, ou seja, ainda estaria dentro de nossa galáxia, aqui pertinho. Ou seja, ainda estaria viajando, e como nós não sabemos a distância daqui para o Céu, ficamos sem saber se, neste momento, falta muito a chegar, ou seja, em nosso modelo cartesiano de compreender o Universo não cabe essa figura, ela é ridícula! Tampouco os antigos acreditavam nisso como “fato”. Afinal, o texto dos Evangelhos não é mera biografia de Jesus, mas uma confissão de Fé no Cristo de Deus manifesto em Jesus, o Cristo.
O que significa então essa afirmação do Credo, “subiu aos Céus”, que celebramos na liturgia como Dia da Ascensão, 40 dias após a Páscoa?
Os textos canônicos dos Evangelhos não trazem uma mesma narrativa. No Evangelho de João, nem há referência a isso; o evangelho termina bruscamente, com Jesus e seus discípulos comendo peixe assado por Ele. Lembremos que João começa com uma festa de casamento que ia acabar mas não acabou [cf. Jo 2.1-12]; e – curiosamente – termina com um churrasquinho de peixe entre amigos (!!!) e uma conversa particular com Pedro [cf. Jo 21].
No Evangelho de Mateus, há uma despedida, que acontece na Galileia, exatamente onde começou o ministério de Jesus; nessa despedida, Jesus se despede e envia os discípulos, referidos como Os Onze [cf. Mt 28.16-20]. O texto de Marcos é muito semelhante ao de Mateus, mas acrescenta ao final que “O Senhor Jesus, depois de lhes ter falado, foi recebido no céu e assentou-se à destra de Deus[cf. Mc 16.14-20].